AFIRMA PEREIRA De António Tabucchi


Desde que, em 1995, pelas telas das nossas salas de cinema passou Marcello Mastroianni interpretando o jornalista Pereira na Lisboa de 1938, que o romance “Afirma Pereira” de António Tabucchi tomou o seu lugar na minha prateleira de livros.

Ver o filme não substitui a leitura do livro e, por isso, voltei a folhear o romance na nova edição de bolso da Leya/Bis. É sempre importante visitarmos Lisboa quando a ditadura fazia o seu percurso, rodeada e guardada pela polícia política, pela censura e por todas as arbitrariedades que o toque fascista se dava ao luxo de cometer. Em plena Guerra Civil Espanhola, com o fascismo de Hitler e Mussolini avançando para a desgraça que viria a ser a Segunda Guerra Mundial e com um salazarismo perfeitamente sintonizado, tinha dias que o natural brilho de Lisboa era substituído por nuvens muito negras.

Se já leram o “Afirma Pereira” voltem a ler, se não, arranjem maneira de o ler. Esta edição de bolso está à venda por menos de seis euros.

António Tabucchi, nasceu em Itália em 1943 e morreu em Lisboa há menos de um ano, a 25 de Março de 2012. Tinha dupla nacionalidade pois desde novo de apaixonou por Lisboa e aqui casou e criou família. Tem uma vasta obra publicada em Portugal, em Itália e no mundo inteiro. De referir que recebeu inúmeros prémios internacionais ao longo da sua vida.

O “Afirma Pereira” foi publicado a primeira vez em 1994. Em Maio de 2012, depois da sua morte, a Leya/Bis publica a 1ª edição de bolso.

Silvestre Félix

HINO IBÉRICO…


Pela janela daquele terceiro andar conseguia ver o mundo.

Via, como tantas outras vezes já disse, o Tejo desde a ponte até à margem do Montijo e Alcochete. Na correria desalmada das marés, enchentes ou vazantes, acompanhava o vai e vem dos cacilheiros, um ou outro grande petroleiro arranjando direção para se enfiar numa das docas secas da Margueira ou esperando, quietinho, ao largo no grande Mar da Palha pelo lado esquerdo do meu ângulo de visão, ainda uma ou outra vela banda duma velha falua ou de simples bote pesqueiro na chegada ao cais.

Conseguia ver, daquela janela do terceiro andar, o ajuntamento desembocado pelos chegados de comboio e que contavam subir a colina pela do Alecrim de amarelo ou então tomarem lugar no 22, 44, 45 ou 8 da Carris para o miolo da Capital. Vi, porque ainda estava na janela do terceiro andar, os protagonistas da Revolução. A multidão cada vez engrossava mais e os militares entravam na praça vindos da rua Bernardino Costa e Arsenal. O meu mundo, naquele dia e visto da janela do terceiro andar, era da cor da vida, da esperança. Os vivas de apoio invadiram o terreiro ao cais e ascenderam ao Camões e ao Chiado com a velocidade de um sopro porque eu vi e senti desde a janela daquele terceiro andar.

O cais do Sodré e da Ribeira foram testemunhas do que consegui ver da janela daquele terceiro andar. Tudo ia ser possível e não voltava a ser preciso forrar a capa dos livros e esconder a primeira página do vespertino “A República”. Os cravos, ainda naquele dia, iam nascer pelas espingardas e a “Grândola Vila Morena” do Zeca Afonso ia ser rainha das cantorias da Liberdade e muito tempo depois contado em anos, seria hino revolucionário cantado em toda a Península Ibérica, desde o parlamento no Palácio de São Bento às manifestações nas ruas de Madrid.

Silvestre Félix

AS DERROTAS...


O Carnaval incomoda o poder!

Sempre foi assim, só que há alturas em que o poder é mais flexível, mesmo a contragosto, tolera e assobia para o lado.

As regras ficam duras quando ele (o poder) se convence que consegue eliminar o Carnaval e tudo o que ele representa.

No que respeita ao Carnaval, todos os tiros saíram pela culatra ao poder.

Silvestre Félix

OS QUATRO MIL…


Entre a renúncia papal e as pazes dos “senadores” Alegre e Soares passam muitos outros sinais de vitalidade desarranjada desta nossa troikada sociedade. O número de quatro mil milhões ou quatro biliões ou, ainda, quatro bilhões como alguns Lusófonos dizem, vai entrando no palavreado do dia-a-dia dos fazedores de opinião e, o comum cidadão tem de levar com a verborreia toda.

De sacrifício já ninguém nos tira. Tiram outras coisas, do bolso, com que se compram os melões. Se do BPN voaram sete mil milhões ou sete biliões ou, ainda, sete bilhões como alguns Lusófonos dizem, porque não vão atrás deles e ainda ficam, a haver, três mil milhões ou três biliões ou, ainda, três bilhões como alguns Lusófonos dizem e de caminho enfiam com os vigaros na cadeia?

Entre o jantar do “patriota” Brito (como se diz no Expresso online) e a carne de cavalo que por aí ou por lá, andam a vender como se de vaca fosse, muitas vigarices e muitas aldrabices enfiam ao “Zé Povinho”. Bem procuro, mas continuo a não encontrar nenhum indício de que tenha havido algum auto de fé promovido pela santa, ou nem por isso, inquisição, em que, para compor a pira ardente no andar debaixo do cadafalso, se lhe empilharam notas de quinhentos euros, muito bem empilhadinhas e, por via dessa fogueira, tenha ido para o beleleu todo o dinheiro que anda faltando nos nossos bolsos.

O lucro da GALP aumentou quarenta e três por cento em dois mil e doze!!!!

Silvestre Félix

“OS CUS DE JUDAS” DE ANTÓNIO LOBO ANTUNES


Não estava certo que o sofrimento dos portugueses chamados “retornados” das ex-Colónias tivesse sido minimizado, ignorado e tantas vezes usado como bola de ping-pong no jogo político do PREC e dos tempos seguintes.  

Nos últimos anos tem aparecido vasta literatura sobre o tema. Algumas obras boas e esclarecedoras da situação, outras más e que carregam nostalgias contra naturas e historicamente desadequadas. Nem todos, na verdade só uma minoria, eram racistas e aplicavam a dose colonialista com o que de pior se entende.
É verdade que os portugueses que fugiram das ex-colónias nem sempre foram bem tratados aqui. Ainda hoje a expressão “retornado” tem uma carga pejorativa desproporcionada. Foram, duma forma geral e nos primeiros tempos, injustamente marginalizados.

O que aqui estou a escrever tem a ver com a transmissão pela RTP da série “E Depois do Adeus”. É exatamente sobre aquela época e aborda a questão dos refugiados das ex-colónias. É um documento sobre a nossa história contemporânea e merece ser visto nessa perspetiva. No entanto, e considerando os tempos conturbados de agora e a caminhada da deriva ultraliberal em curso, tenho receio que, o que na altura foi certo vire errado e o errado passe a certo.

Não podemos esquecer que houve culpados de todos os sofrimentos de há 40 e 50 anos. No pós-guerra (finais década de 40 e durante a de 50 do século passado), as democracias europeias trataram de dar um final aos seus impérios e fizeram as descolonizações acautelando os interesses nacionais e dos cidadãos residentes nas colónias.

No nosso caso o que foi feito? Salazar, quis escrever a história ao contrário e impôs o maior sofrimento jamais aplicado por um governante nacional aos seus e aos povos das ex-colónias – a guerra! Foram 13 anos de mortes e estropiados de todos os lados. Aqui está a verdadeira culpa! Salazar e os seus apaniguados fascistas.

Para contrabalançar a perigosa “onda” acusatória de alguns acontecimentos após 25 de Abril, aconselho a leitura de “OS CUS DE JUDAS” de António Lobo Antunes. Nunca li narrativa que melhor me “mostrasse” os horrores e as culpas da Guerra Colonial. E, para quem ainda tem alguma dificuldade em lidar com a genialidade da escrita de António Lobo Antunes, o romance “Os Cus de Judas” é o ideal para a ultrapassar, como aconteceu comigo. Este romance é o segundo da sua bibliografia oficial e foi publicado em 1979.

A 30ª edição desta obra é das Publicações D. Quixote do universo Leya e a versão bolso da BIS de Dezembro de 2010. Ainda se vai vendo por aí.

Silvestre Félix

PORQUE NÃO SE CALAM?

PORQUE NÃO SE CALAM? São praticamente os mesmos, que há menos de dois meses, bradavam “aos céus” por medidas mais restritivas, fortes e ...